domingo, 2 de março de 2014

Lágrimas de areia

A cobrança é como uma peteca. Mas não é uma peteca comum. Quando o jogo é uma disputa, ela é como uma bola de meia à qual os jogadores adicionam areia cada vez que a recebem e depois arremessam de volta. Metáfora meio confusa. Poderíamos associá-la ainda ao jogo batata-quente. No caso, é batata-fria.

Quem começa? É esta uma pergunta extremamente importante, porque sendo que quando um não quer, dois não brinca, a pergunta é feita mesmo assim, pra saber em quem por a culpa. É uma pergunta interessante pois deveria ser desnecessária.

Tendo começado, o jogo de pesos vai se seguindo, testando quanto cada um aguenta, quanto mais cada um consegue encher a peteca. Disputávamos ela e eu. Eis aqui um jogo enfadonho. Impacientes, queremos abandoná-lo o quanto cedo. Ninguém sabe quando é o início ou do que se brincava antes. Acho que antes nós brincávamos, apenas.

Eis que já aborrecido ponho toda a areia que consigo na bola de meia, já enorme, e me esforço em arremessá-la na direção da garota. Agarra, tropeçando e caindo para trás. Pensei convencido que ela se daria por vencida e eu poderia ir embora do jogo.

Julguei que me desvencilharia da jogatina facilmente e que não haveria de me preocupar. Mas ela, que estava lá, machucada, sentada num canto, com a peteca - que lhe pesava no colo - juntou as forças restantes e arremessou-me a peteca de volta.

Desta vez, eu agora curvado no chão. Meu um olhar de derrota e o dela arrependido. Ela no entanto fazendo valer seu intento: fronde reerguida, coluna ereta.

Eu derrotado no chão, com 1 tonelada - que ainda faço aumentar - e mesmo agora, compreendendo o jogo, de audácia me ponho a pensar que a culpa foi dela. Arremessar de volta? Não há pra quem. Eis uma evidência da inutilidade de uma resposta apenas existir: tudo depende do estalo da ação. Que no caso não é estalo, nem atividade.

Derramar toda a areia, em lágrimas...